O Barrense


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Mini Mundo: Saudade

Minu Mundo coluna

No dia 30 de janeiro é comemorado o dia da saudade, essa palavra existe apenas na língua portuguesa e galega, serve para definir o sentimento de falta de alguém ou de algum lugar.

De origem latina, saudade é uma transformação da palavra solidão, que na língua escreve-se “solitatem”. Com o passar dos anos, assim como outras palavras se transformam de acordo com as variações da pronúncia, “solitatem” passou a ser “solidade”, depois “soldade” e, finalmente, saudade.

Reza à lenda que o termo foi cunhado na época dos descobrimentos portugueses e do Brasil colônia, quando esteve muito presente para definir a solidão dos portugueses numa terra estranha, longe de entes queridos. Define, pois, a melancolia causada pela lembrança; a mágoa que se sente pela ausência ou desaparecimento de pessoas, coisas, estados ou ações.

A memória de algo que aconteceu e que dificilmente voltara a acontecer da forma como foi na oportunidade, pode-se definir por saudade. O que aconteceu na madrugada de domingo dificilmente voltara a acontecer na forma como foi. A soma de descasos públicos e privados, em diversas instancias, criou a maléfica oportunidade de vitimar jovens brotando para a vida.
A corja, e o significado para corja é conjunto de pessoas desprezíveis, de má nota.  Indignos de serem considerados humanos, que ocupam cargos públicos, ou privados sedentos por lucro, que compram votos e vendem alvarás estão mobilizados na tentativa de reparar o irreparável. Ou pior: Nefastamente empurrando com a barriga suas obrigações pré e pós-tragédia. Setor publico e privado negligenciaram ações e agora se abstém da responsabilidade.
Talvez em incêndios em boates não morra mais ninguém no Brasil, mas o descaso e leviandade da escoria ira continuar nos vitimando nas estradas precárias, nos hospitais sucateados ou na falta dos mesmos, na segurança ineficiente, na base desqualificada da educação. Estamos entregues, rendidos, abandonados pela corja.

A inexistência de prevenção, somada a negligencia, certamente terá resultante caótica. Deficiências do Estado brasileiro (nas esferas federais, estaduais e municipais) e da classe política (todos os partidos, os ditos direita e esquerda) que somam e multiplicam problemas em seus respectivos setores. O Estado brasileiro se especializou em não fazer a prevenção ou, como diz o ditado popular, “cortar o mal pela raiz”. Sem prevenção, tragédias se repetem periodicamente.

O derradeiro jogo de empurra deslancha na impunidade. Após sermos apresentado as listas que ninguém desejava ler, esperamos pela terceira: a primeira de vitimas; segunda de feridos; terceira de punidos.
Corrupção, ausência de prevenção e impunidade não deveriam ser perpetuados em solo brasileiro. Aguardamos sob amparo do ditado popular: a justiça tarda, mas não falha.

Saudade é o que familiares sentem de seus jovens que tiveram o direito de viver negado, furtado, covardemente.

Espero um dia recordar este passado nebuloso e ter a agradabilíssima surpresa de viver em um futuro melhor. Mas nunca esquecendo as atrocidades de outrora. Pois, povo que não conhece a sua história está condenado a repeti-la.


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Mini Mundo: Sonho perturbador, alusão a Santa Maria?

Minu Mundo coluna

Os sonhos são encantadores. Perpetuam fascínio na humanidade desde os primórdios, inclusive entre egípcios e, singularmente, entre judeus do Antigo Testamento. Em diversas culturas os sonhos foram considerados maneira de comunicar-se com o transcendente, uma forma de se prever o futuro das pessoas. Há informações de um papiro egípcio datado de 2000 AC que discute sonhos e suas interpretações. Era crença na Grécia Antiga de que o sonhador estava em contato com os deuses, inclusive no poema Ilíada, de Homero (c. 800 AC), por exemplo, os sonhos foram considerados mensagens dos deuses.

Descrevo a vocês o sonho de um senhor na madrugada passada. Curiosamente semelhante à tragédia ocorrida em Santa Maria. De maneira alguma desejo aproveitar-me de tal situação com objetivo de “audiência cibernética”. Apenas relato o que me estarreceu. Durante sua explanação permaneci cético e, por vezes, com semblante irônico frente ao sonho.

“Sonhei que estava andando pelo bairro picada (bairro em Barra do Ribeiro, as margens do rio Guaíba), acompanhado de alguém, cujo nome e feição, no sonho, não remetia importância. Subitamente uma espessa nuvem rompeu os céus no sentido da Lagoa dos Patos. As arvores encobriam a visão, visualizava-se apenas a espessa nuvem. Imediatamente soube, não preciso saber como, que era um navio, provavelmente havia explodido. Após a nuvem, labaredas de fogo propagaram-se no Mato Alto (parte continental que separa Rio Guaíba da Lagoa dos Patos). Rapidamente queimaram toda mata nativa e rumaram a cidade. No Rio Guaíba ardia o fogo sob as águas, estimo que seria gasolina ou algo semelhante. O fogo devastou região nativa próximo ao Mato Preto.
As labaredas flamejavam sob as águas chegaram sem força as margens praianas de Barra do Ribeiro.
Repentinamente o sonho ‘pulou’ e deparei-me em fila para adentrar em um banheiro. Havia muita gritaria a pessoas desejando entrar no banheiro. Um homem disse:

– Não preciso ficar na fila – e destinou-se a porta, forçando-a, porém, sem sucesso.

Após isto, acordei.”. Concluiu.

Este senhor confidenciou-me que sempre sonha com água. Talvez por sua infância for às margens do Rio Guaíba e família de origem ‘pesqueira’.
O banheiro é outra minúcia em seus sonhos. Sempre presente. Seja qual for o enredo e desenrolar da trama.

De antemão aviso. Não houve mortes. O sonho foi após o incidente, por volta das seis horas.

Algumas minúcias, caso casadas e interpretadas como tal, remetem a semelhanças entre sonho e tragédia:

– Queimada de arvores, menção às pessoas.

– Fogo espalhando-se rapidamente sob as águas, alusão à queima da acústica que culminou na espessa nuvem negra.

– Porta fechada do banheiro, referente aos seguranças que barraram a saída da boate e, sobriamente, o banheiro onde muitos faleceram asfixiados.

A oniromancia, previsão do futuro pela interpretação dos sonhos, tem grande credibilidade nas religiões judaico-cristãs: consta na torá e na bíblia que Jacó, José e Daniel receberam de Deus a habilidade de interpretar os sonhos. No Novo Testamento, São José é avisado em sonho pelo anjo Gabriel de que sua esposa traz no ventre uma criança divina, e depois da visita dos Reis Magos um anjo em sonho o avisa para fugir para o Egito e quando seria seguro retornar à Israel.

O sonho oferece ao ser a principal via para adentrar no inconsciente. Pescamos de nosso inconsciente para consciência nossos desejos mais reprimidos e ‘proibidos’, anseios recalcados, nossos objetos de desejo. Através dos sonhos que temos a aptidão de vivenciar tais fantasias.
Mergulhando profundamente neste vasto mundo de ‘sede’ reprimida, realizamos imersão ao nosso inconsciente, ou seja, para dentro de nós mesmos, tentando procurar o máximo de realização.
“Conhece-te a ti mesmo”, ordenou o grande filosofo. Mergulhar dentro de si próprio e reconhecer lá em seu âmago as suas clarezas e as suas escuridões.


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A maior tragédia de nossas vidas, por Fabrício Carpinejar

Por Fabrício Carpinejar.

Morri em Santa Maria hoje. Quem não morreu? Morri na Rua dos Andradas, 1925. Numa ladeira encrespada de fumaça.

A fumaça nunca foi tão negra no Rio Grande do Sul. Nunca uma nuvem foi tão nefasta.

Nem as tempestades mais mórbidas e elétricas desejam sua companhia. Seguirá sozinha, avulsa, página arrancada de um mapa.

A fumaça corrompeu o céu para sempre. O azul é cinza, anoitecemos em 27 de janeiro de 2013.

As chamas se acalmaram às 5h30, mas a morte nunca mais será controlada.

Morri porque tenho uma filha adolescente que demora a voltar para casa.

Morri porque já entrei em uma boate pensando como sairia dali em caso de incêndio.

Morri porque prefiro ficar perto do palco para ouvir melhor a banda.

Morri porque já confundi a porta de banheiro com a de emergência.

Morri porque jamais o fogo pede desculpas quando passa.

Morri porque já fui de algum jeito todos que morreram.

Morri sufocado de excesso de morte; como acordar de novo?

O prédio não aterrissou da manhã, como um avião desgovernado na pista.

A saída era uma só e o medo vinha de todos os lados.

Os adolescentes não vão acordar na hora do almoço. Não vão se lembrar de nada. Ou entender como se distanciaram de repente do futuro.

Mais de duzentos e cinquenta jovens sem o último beijo da mãe, do pai, dos irmãos.

Os telefones ainda tocam no peito das vítimas estendidas no Ginásio Municipal.

As famílias ainda procuram suas crianças. As crianças universitárias estão eternamente no silencioso.

Ninguém tem coragem de atender e avisar o que aconteceu.

As palavras perderam o sentido.

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