O Barrense


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Mini mundo: DNA Daço

Minu Mundo coluna

Saudade. Essa palavra existe apenas na língua portuguesa e galega, serve para definir o sentimento de falta de alguém ou de algum lugar. A memória de algo que aconteceu e que dificilmente voltara a acontecer da forma como foi na oportunidade, pode-se definir por saudade. O que aconteceu na madrugada de domingo dificilmente voltara a acontecer na forma como foi. Mas e quando você não conheceu a pessoa e, inexplicavelmente, sente saudade? Saudade pelo que não foi vivido. Pelo que jamais acontecera. As areias do tempo correram (mais do que e como deviam) e afastaram meu avô, Edaci, do pequeno Eduardo.

Era um homem simples, o meu avô. Com seus vícios e virtudes. Casou, teve muitos filhos, e por meio destes pude conhece-lo. Estranho conhecer uma pessoa por meio de palavras. Cabe a você apenas imaginar. 

O conheci (bem, conheci não conhecendo) ainda pequeno. E só posso comprovar este fato por fotos. Não tenho uma recordação sequer. Vazio. O nada absoluto.

E como sinto saudades? Pelos causos. Os relatos. Meu avô é (sim, ainda é, pois a cada historia contada, acende em mim o chama de buscar o desconhecido, de saber o porquê sou assim) fascinante. Sabia de tudo um pouco. Fala-se de sua sabedoria mecânica. O dom da navegação. O deslumbre por tesouros. Estes dois últimos em especial me cativam. Sou todo ouvido quando surgem causos de suas aventuras náuticas ou do seu fascínio pelo ouro do tesouro da formiga. Entrego-me a estes assuntos, pois sou duplamente apaixonado por eles. Navegar é preciso disse o poeta. Meu pai conta da fúria da natureza contra a canoa que meu avô comandava. As ondas batendo contra o casco. As crianças, entre elas meu pai, acocoradas na proa do barco e na popa (parte de trás da embarcação), meu avô, altivo, o olhar perdido no horizonte, no comando do leme, guiando a canoa entre o revolto rio. Encontrando brechas e atalhos que só ele conhecia. Para no fim encontrar porto seguro, e quando necessário, recomeçar.
E quanto aos tesouros, bem, deve ser coisa hereditária, passada de pai para filho (meu pai também é apaixonado por tesouros). Quantas folhas de papel rabiscadas. Teorias e mais teorias. Seriam piratas? Os jesuítas? Ele apostava nos jesuítas. Meu pai aposta nos jesuítas. Eu aposto nos jesuítas. Apostas, apenas apostas.

Imagine como seria uma roda de conversa com ele? Temos tanto em comum. Comungamos das mesmas ideias. Os mesmos desejos. O gosto pela navegação (alias, isso é de família). Apenas imagino e lamento.

Neste emaranhado de características que caracterizam a personalidade de meu avô, falta-me algo substancial: o dom desbravador. Meu avô possuía a capacidade impar de lançar-se a aventuras. A navegação e caçadas ao tesouro eram constantes. Devia ser algo inerente a ele. A busca pelo novo. Ele era assim.

Na complexidade do DNA, não herdei um elemento primordial: o espírito aventureiro nato.

Sim. Nato. Porque são poucos os que aceitam o desconhecido. O inesperado. Querer todos querem, mas fazer é para poucos. Encarar a totalidade do mundo, a sua complexidade, e mesmo assim enfrenta-lo de peito aberto. Não imagino como ele fazia isso, apenas desejo a formula.

Sabe aquela ânsia de estar vivo? De sentir o sangue pulsando entre veias? É isso. A vontade de jogar tudo para o alto e velejar mundo afora. “Conhecer as manhas e as manhãs”, desbravar o mar como os antigos. Poucas coisas são mais imprevisíveis do que velejar. Quem navega não sabe o que vai encontrar, por quantas intempéries irá passar e, muitas vezes, nem para onde o destino o levará. Quanto mais se navega, mais coisas se aprende. Tempestades deixam de assustar, embora sempre haverá uma ou outra que gere medo, talvez pavor, sempre receio. O importante é nunca olhar pra trás. Sempre içar velas, sempre velejar.

Tenho o desejo de navegar o globo. Os sete mares. Tenho desejo de buscar tesouros. De sanar a duvida familiar se realmente eram os jesuítas. Tenho duvidas.

Um câncer abreviou sua vida. Acabou com o que deveria enriquecer minha experiência em vida. Beber direto da fonte dos meus anseios. Sanar meus questionamentos mais íntimos. Destilar minhas duvidas a quem possuía todas as respostas.

Mas os tempos são outros. As pessoas mudaram. E eu, bem, eu não sou meu avô.


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Mini Mundo: Despedidas

Seguindo a cronologia de crônicas destinada a expectativas encerro este capítulo com saldo positivo.

O primeiro Capítulo: Epifania https://obarrense.wordpress.com/2013/10/09/epifania/

Segundo: Sonhos não sonhados https://obarrense.wordpress.com/2013/11/01/mini-mundo-sonhos-nao-sonhados/

Parece que foi ontem em que iniciei meu estagio em saúde. O tempo realmente voa, pois terminei meu estagio com indivíduos portadores de necessidades especiais hoje, quinta-feira (28). Faltam-me palavras para explicar o quão mágica foram estes seis meses em que fui professor. Alias, acho que fui mais aluno do que professor.

E como qualquer outro estagio, este também chega ao fim. E tenho de lidar com a despedida.

Despeço-me hoje para reencontra-los amanhã. A experiência que vivi foi única e singular. Seis meses de ensino e aprendizagem. O “eu” de hoje com certeza não é o mesmo do “eu” de antes. Admiro o mundo com outros olhos, sob novas perspectivas.

Não sei lidar com a partida. Despedida me dói na alma. Arranca um pedaço de mim sem dó nem piedade. O ar foge dos pulmões. Um vazio preenche tudo.

Não deveríamos ser capazes de nos apegarmos com tamanha intensidade se temos que nos despedir depois. Os laços podem permanecer. Mas é mais do que isso. Bem mais. É o querer tocar, abraçar, olhar. Sorrir ao ver o sorriso.

O tempo passa. O adeus é inevitável. Inadiável. Tenho a sensação que este estagio serviu para despertar sentimentos maravilhosos em mim quando tudo parecia perdido. Ajudaram-me a encontrar o eixo. E agora tenho que trilhar sozinho.

Sei que vou vê-los ainda. Sei também que neguei até o último minuto que iam embora. Mas agora tenho que aceitar de verdade.

As lembranças são nosso elo mais forte. Eu nunca vou esquecer os sorrisos, as palavras e o acolhimento daqueles dias.

Escrevo isso como forma de tentar expulsar de mim um pouco da agonia que sinto no momento. De deixar as lágrimas correrem sozinhas. E saber que hoje nos despediremos é muito difícil para mim.

Sei que sou melodramático e tudo isso foi escrito de forma meio que definitiva. Não é isso. Até porque eu acredito que eles voltem. Mas se voltarem, eu tive que lidar com a partida. Eu não sei lidar. Sou egoísta e quero que fiquem comigo para sempre. Mas também quero que sejam felizes.

Vocês estarão comigo, como sempre estiveram. No lugar mais precioso que eu puder guarda-los. E conquistem o mundo. Suas vitórias serão minhas também. A minha torcida é toda para vocês. E quando nos reencontrarmos tudo será como sempre foi. Só peço que sejam felizes. Muito felizes. Seja aonde for.

O futuro está sempre mais próximo do presente que o passado.
Todo fim é um novo começo.

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Mini Mundo: Sonhos não sonhados

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O menino que em outrora nos habitava, cultivando sonhos, passa a residir em algum lugar remoto, inacessível. Um cemitério de sonhos, inóspito, onde o coveiro – menino – segue sua rotina, na esperança de não mais enterra-los, mas vive-los, e finalmente fechar os portões deste local que o atormenta.

Em algum receptáculo oculto o destino guarda algo bom para você. A esteira de sonhos segue em sua rotina. Mas, de alguma maneira inexplicável, este não foi um sonho sonhado. Talvez ocorreu-me um lapso onírico e não pude idealizar este evento surpreendente.

Certas vivencias nos brindam quando ultrapassam a fronteira entre o real e o imaginário. Semelhante ao peixe que habita o vasto e profundo oceano, mas, em raros momentos de beleza inigualável, salta, abandonando seu habitat, e refrescando-se, mesmo que efemeramente, com a brisa marítima. Assim são os sonhos. Peixes habitando um imensurável oceano, e, em oportunidades especificas, se desvinculam do manto quimérico e são fisgados para o barco da realidade.

Um dos caminhos mais eficazes para a frustração é criar expectativas. É da natureza humana esperar que algo muito desejado aconteça rapidamente.
E, quando vivemos de modo inconsciente, não conseguimos perceber este jogo que nos leva sempre a esperar pela realização urgente de nossas esperanças e a sentir uma grande decepção quando elas não se concretizam.

O encanto de sofrer este lapso onírico e não ter expectativa alguma em relação ao póstero tem como resultante ser agradavelmente surpreendido. Deixo-me embalar pelo acaso. Seu frescor acariciando meu rosto sem responsabilidade alguma. Minha vara de pesca segue na água, serpenteando entre peixes, vacilando nas vagas.

Neste mar de sonhos você deve estar se perguntando o que foi que fisguei. Tenha absoluta certeza que jamais esperaria tal espécime. Alias, um cardume. Raríssimo. O mundo como conhecia fora abalroado. Perdi meu norte. Meus polos inverteram. Confesso que fiquei receoso de adentrar neste mundo, ate então desconhecido. Titubeei ao receber o exótico “convite”. Inesperado. Estagiar com deficientes intelectuais.

Fitava os portões do novo mundo. Curioso a respeito de suas peculiaridades. Cético quanto a minha capacidade. Mergulhei em meu âmago e encontrei corajem necessária para aceitar tal proposta. Adentrei nos portões do novo mundo com incerteza no olhar, mas, convicto de que o “eu” de antes ficara nos portões, e, o “eu” de agora, transformado permanentemente, indubitavelmente.

A experiência de estagiar com este publico alvo tornou-se divina. Algo que não me imagino sem no futuro.

Minha isca segue no mar, serpenteando. A procura do inimaginável. O sequer sonhado.


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Mini Mundo: A pequenina

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O que esperar de uma terça-feira? Provavelmente nada. Terças-feiras não possuem nada de especial. Elas apenas respeitam sua ordem semanal. Você sabe, após a segunda, antes da quarta, vinte e quatro horas e etc. Mas, esta terça me reservou algo… Miraculoso, mágico. E eis onde reside o encantamento de nossa existência: a capacidade de sermos surpreendidos por fatos vindouros. Preferencialmente simples. E neste emaranhado de acasos, onde o destino tece sua teia, o danado me brindou. Surpreendentemente. Renovando a fé na humanidade por intermédio de uma criança.

Encontrava-me no ônibus, exausto. “Admirando” a espessa bruma de fritura que permeia a rodoviária. E, as minhas costas, um exótico dialogo prendeu minha atenção.

Uma garota, não saberei precisar a idade da pequena, sou péssimo neste quesito, tagarelando junto a sua mãe. A mãe, extenuada e pouco ligando para ponderações e perguntas da garotinha, a ignorava por completo. Confesso que até eu estava enfadado com tamanha fanfarronice. Quando:

– Mãe! Preciso fazer alguma atividade física!
– Atividade física? Pra que minha filha?
– Preciso!
– Precisa?!
– Sim! Atividade física é vida.
– Hum… Qual?
– Não sei. Judô, muay-thai, capoeira… Algo do tipo.
[silencio]
– Então, mãe?
– Luta? Na tua idade?
– Porque não? Estou na importante fase de crescimento.
– Sei. “fase de crescimento”.
– É! Meus hormônios precisam de estímulo.
– Hormônios? Hahaha.
– Sim, mãe! Eles são preguiçosos. A atividade física ativa eles. Igual acender uma lâmpada.
– Qual a ligação entre atividade física e lâmpada?
– Se ninguém acionar o interruptor a lâmpada segue apagada.
– …
– Mãe?
– Que foi minha filha?
– Não quero ser uma lâmpada apagada.
– Mas precisa ser logo luta? Porque não vôlei? Dança? Isso. Dança!
– Nnnnnão!
– Quer o que?
– Judô, muay-thai, capoeira, hapkido…
– Mas minha filha…
– Mãe, é importante ser fisicamente ativo.
– Conversaremos sobre isto em casa. Agora me deixa dormir.

De fato, a conversa cessou. Mas a menina seguia cantarolando e volta e meio chutava meu banco, quem sabe já estava treinando muay-thai? Ela poderia seguir a viajem inteira esmurrando meu banco, já não me importava. Sua atitude me comoveu. A sagacidade e seu poder de persuasão, contornando as negativas da mãe e apresentando provas cabais que justificavam sua teoria, impressionavam. E principalmente o desejo de praticar uma atividade física. Relevei o desprezo e preconceito da mãe junto ao universo das lutas. Estereótipo clássico. Menina dança e meninos jogam futebol. Menina não pode transpirar, ou sujar-se. A pequenina rompe barreiras. Com atitudes diz: basta aos preconceitos sociais e paradigmas preestabelecidos.

Dizem que a esperança é a ultima que morre. Pois bem, lhes aviso que ela segue viva. Ardendo. Não a abandone.
Além da iniciativa em querer praticar alguma atividade física por livre e espontânea vontade, me impressionou o fato da menina ter bons argumentos quanto ao porque de praticar atividade física. Em diversos momentos deixando a mãe em mais lençóis, visto que a menina estava completamente certa.
Vencemos essa batalha, menininha, não a guerra. Na sua casa, siga debatendo, não se de por vencida. Enquanto o gongo não soar haverá esperança.


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Mini Mundo: Complexo de Frankeinstein

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Complexo de Frankenstein é um termo coloquial para designar o medo de robôs. Nos livros de Asimov a fobia estende-se a máquinas que lembram seres humanos (androides).

O complexo de Frankenstein, citado por Victor Asimoov, como uma das barreiras a aceitação aos robôs, é de uma sequencia lógica perfeita e nada equivocada. Pois remete a simples questão contemporânea. O homem sendo um perigo a si mesmo. Julgando o inferno como sendo os outros, mas sem reconhecer que o inferno é o próprio ser. Se no romance Frankenstein a criatura revoltou-se contra seu criador, por rejeição e ojeriza a sua aparência, o complexo do século XXI seria os homens submissos aos robôs, visto que os seres biológicos estavam pondo em risco sua própria existência e deteriorando o planeta em que reside, elemento primordial para nossa existência.
Ou seja, a revolução das maquinas. Que visam proteger o homem de si próprio, cujo objetivo é não por a raça em extinção.

O nome deriva de Victor Frankenstein do livro Frankenstein, de Mary Shelley. Na história de Shelley, Victor Frankenstein cria um ser inteligente. Ele considera a sua criação atroz, e decide abandona-lo. Isto acaba causando a morte de Victor como conclusão de uma vingança entre ele e sua criação. A criatura é provavelmente o primeiro robô verdadeiro na literatura, mesmo que ele sendo totalmente orgânico.

Esse ser é o resultado da compulsão do homem por querer superar as gerações anteriores e quiçá o próprio Deus.

Note-se a distinção entre Frankenstein o criador e o monstro de Frankenstein: Complexo de Frankenstein, não é medo de roboticistas ou cientistas loucos, mas sim de seres humanos artificiais, embora o medo de uma coisa, de um modo geral implica algum medo da outra.

A opinião pública em relação a robôs na maioria das histórias de Asimov é de medo e de suspeita: o medo das pessoas comuns é que robôs iram substituí-las ou domina-las.


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Mini Mundo: A importância do porque

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– Mãe, porque crachá?

– Ora, porque sim, meu filho!

– Mas porque, mãe?

– Deixa ele quieto aqui na gola.

– Porque eu tenho que colocar?

– Para visitar o papai, querido.

A fase dos porquês ocorre devido à construção da própria identidade, que acontece na infância, quando a criança passa a se descobrir, a ter noção do próprio “Eu”, da importância de sua existência, das coisas que consegue fazer, que vê ou que ouve.

A partir dessa descoberta, passa a perceber os fatos ao seu redor dando maior ênfase a como tudo acontece, ou seja, os porquês referentes à esses. Muitas vezes as crianças nos questionam repetidamente e emendam um porquê atrás do outro.

Uma rápida conversa entre mãe e filho no elevador. Alias, típica entre crianças beirando a idade dos porquês (sou péssimo para analisar idade de crianças). A principio não me chamou atenção. Porém, estando no elevador, há pouco para se pensar e reparar (a não ser o súbito raciocínio que o elevador pode despencar com você no mesmo. Pensamento sem lógica alguma, pois você apenas se recorda estando dentro do elevador.), ou, se for mulher e tiver um espelho a sua disposição, dar um tapa no visual. O estalo de atenção ocorreu quando o menino começou com os porquês, e repentinamente atraiu minha curiosidade. Ansiava e fazia a leitura labial dos lábios do menino, antevia suas perguntas, sem lógica ou sequencia alguma. Mas intrigava-me, como e porque uma criança perguntava tanto. Estava claro: para ele tratava-se de um território hostil, desconhecido, e, como toda criança, desejava conhece-lo. O velho e bom instinto desbravador.

Enquanto fazíamos a viajem nesta incrível maquina que nos leva em segundos a nosso destino, matutei o porquê de perdemos a naturalidade de questionar. Ao envelhecermos nos auto privamos da capacidade de inquirir, de conhecer o novo. De demonstrar insabido frente algum assunto especifico. Desconfio que nosso superego bloqueia qualquer iniciativa, pois, atualmente necessitamos, mais do que sermos, aparentar austeridade, ser uma fortaleza frente a sociedade.  Perante preconceitos sociais perdemos o poder do porque infantil. Não mais conhecemos, desconhecemos, não nos deixamos levar pela curiosidade, optamos pela frivolidade, uma subterfúgio humano de maneira desumana, entregue. O menino que em outrora nos habitava, passa a residir em algum lugar remoto, inacessível. Um cemitério de sonhos, inóspito, onde o coveiro – menino – segue sua rotina, na esperança de não mais enterra-los, mas vive-los, e finalmente fechar os portões deste local que o atormenta.
Nos limitamos a fitar nosso “pirralho” interior, adormecido e calejado pelo tempo e sorte desafortunada. Recordamos bons momentos, a infância perfeita, demasiadamente ideal para se tornar realidade, mal sabe ele que basta acreditar. E, no canto do cisne, enfim questionamos: onde foi parar aquele menino repleto de sonhos? O que ele se tornou?

O pequenino saiu do elevador questionando. Segui no mesmo, imaginando seus porquês.
Recomecei a questionar.


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Mini Mundo: Comitiva barrense nos Estados Unidos

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Reza a lenda que uma comitiva barrense rompeu barreiras sociais em solo americano.
O causo aconteceu entre as décadas de sessenta e setenta, quando empresários decidiram rumar à terra do Tio Sam com objetivo de comercializar os grãos produzidos no município. As portas até então estavam fechadas para comercio internacional, sem contar que receberiam em dólar.
Um só granjeiro não somaria quantia necessária para importar e ainda obter lucro, portanto, uma comitiva formada por seleto grupo de “barões” rumou aos Estados Unidos.

Evidentemente a viajem tornou-se um marco na época. Barrenses com destino aos Estados Unidos, e pasmem, comercializando nossos produtos. Alguns permaneceram céticos frente ao sucesso, outros empolgados sob-perspectiva de receber em dólar. Porém, ninguém previu o impacto gerado, em solo americano, por comitiva do interior do Rio Grande do Sul.

A “trupe” iniciou sua jornada e, ao pisar em solo americano, um guia os esperava. Apresentou a cidade, cultura norte-americana, lugares a serem frequentados e etc. Mas, uma peculiaridade americana não passou despercebida. Dentre tantos, um audaz empresário indagou o porquê de caminharem por apenas uma das calçadas. O guia então respondeu que havia diferenciação entre cidadãos de tez escura e clara. Portanto, calçadas, estabelecimentos, escolas e outras tantas instituições visivelmente “adaptadas” as condições impostas pelo preconceito.
O ceticismo pairou sob os granjeiros. Negavam-se a acreditar. Foi quando, repentinamente, um os granjeiros destoou dos demais, cruzou a rua, e passou a caminhar na calçada destinada aos negros. O guia, americano ou brasileiro habituado aos preceitos norte americanos, surtou. Considerou tal atitude uma afronta às normas sociais americanas. O brasileiro seguiu caminhando e, ainda mais surpreendentemente, entrou em restaurante, obviamente destinado a negros. A comitiva seguiu o impetuoso conterrâneo. Inicialmente o chefe do restaurante, naturalmente negro, surpreendeu-se frente ao grupo em seu restaurante. Mas foi rapidamente persuadido pelo barrense. O brasileiro argumentou que em sua terra natal não havia racismo. As calçadas eram para todos, sem diferenciação. Ainda ressaltou que as profissões em sua granja independiam de “raça”. O chefe sensibilizou-se e serviu o melhor prato para a comitiva.

O guia embasbacado não reagiu. Seu baixo e racista intelecto considerou uma afronta aos padrões sociais de época. Porém, a comitiva realizava o mais nobre ato para frear e desmoralizar o racismo.
Se a sociedade americana, e porque não a brasileira, considerava racismo algo a ser extinto, agiam hipocritamente. Os americanos, em suas atitudes, desmerecem o árduo trabalho de Abraham Lincoln.

Cidadãos de terceiro mundo, civis de um país subdesenvolvido apresentaram o cartão de visitas brasileiro: aversão à discriminação racial.

O causo ganhou notoriedade na cidade. Pudera, um interiorano barrense enfrentou a toda uma sociedade e seus preconceitos arcaicos com singelo ato de atravessar rua e alimentar-se em restaurante. Barrenses quebrando paradigmas em solo norte-americano. Quanto aos negócios? O maior tratado foi demonstrar, em atitudes, a ojeriza ao racismo.

De fato, estes foram tempos nebulosos que deixaram cicatrizes na historia mundial.
A “trupe” brasileira quebrou paradigmas. Suspeito, e ainda mantenho-me cético, que norte-americanos consideram e consideravam America Latina residência de seres desprovidos de inteligência. Estes nobres tupiniquins responderam à altura. Um basta ao racismo perpetuado.

***

Se, no decorrer do texto, passei impressão que não há racismo em solo brasileiro, me perdoem. São 386 anos de escravidão. Décadas e décadas de violência policial racista e exclusão. 512 anos de discriminação.
Não que o racismo em terras tupiniquins foi abolido, talvez “formalmente”. Um cidadão que não teve acesso a boas escolas desde o berço e encara o lado desagradável da pirâmide social logo depois de abrir os olhos é incapaz de raciocinar sobre sua condição e compreender que enfrenta dificuldades pelas quais não tem a menor responsabilidade como indivíduo, mas como herdeiro de uma estrutura social desigual e injusta.

O dito causo ocorreu durante ditadura militar, cujo governo ficou reconhecido por polarizar classes sociais. Pós-ditadura governos democráticos adotaram ações afirmativas como métodos de frear desigualdade social e discriminação racial. O empresariado surpreendeu por, durante regime militar, demonstrar em atitudes aversão ao racismo.


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Mini Mundo: Formiga

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Se tivéssemos agendado o dia da nossa morte, será que faríamos tudo como fizemos? Porque quando nos deparamos com a vida mesmo, ao perceber que a morte existe, entramos em desespero. A vida mesmo, pura e destilada, nos dá medo. Não é a morte que nos assusta, é a vida. É ela que enxergamos, ao mirarmos, por transparência, a morte. Notamos o balanço da corda bamba em que caminhamos diariamente. Perdemos o equilíbrio sobre a tênue linha entre a vida e a morte. Linha esta que, a cada passo, tentamos não olhar para baixo.

Definitivamente só passamos a dar valor à vida quando o extremo da mesma bate a nossa porta. A morte.

Diariamente subestimamos o que esta ao nosso redor. Desdenhamos nosso inimigo sem conhecê-lo. Ontem o fiz.

Amo o futebol. Ainda que este tenha me pregado peças incessantemente. Uma relação de amor e ódio, mas convivemos. O desporto me completa, sacia minha sede.

Naturalmente joga-se futebol em campos. Lindos tapetes verdejantes onde desfilam chuteiras e um objeto esférico. Porém, minha desgraça habita o campo: formigas. Inseto nanico cuja existência é desprezada. Averiguei de forma danosa sua existência.

Uma mordida bastou. Pipocou, coçou, pressão caiu, enuviou os sentidos. Desmaiei.

Decididamente tamanho não é documento. Uma reles formiga fez imenso estrago em meu organismo. Inseto abundante no planeta e com uma simples e cruel pisada o aniquilamos. A banca paga e recebe. Bem como pisoteamos descomunal quantidade de insetos rastejantes, por motivo vil, eles revidam como medida de autodefesa. Demarcam e defendem seu território de invasores hostis.

David versus Golias. Embate desproporcional e, a principio, covarde.
Um dos combatentes, armado com todos os apetrechos que inevitavelmente proporcionaria uma vitoria inapelável a luta:espada, armadura, faca, escudo, elmo e obviamente, o cavalo!
O outro, além de fé e os pés no chão: apenas uma funda na mão.
O primeiro, o poderoso Golias; o segundo (o ate então, frágil David).
Reza a lenda que Golias, guerreira nato, ao contemplar seu oponente riu às escancaras:
“Será por ventura, eu um cão para ser batido a pão e pedra?!” vociferou, acelerando e peleja… O resto todo mundo já sabe.

O fato e a passagem têm muito de verossimilhança com a realidade, haja vista tamanha insignificância do oponente contra um gigante de força e voracidade!

Frente a tal acontecimento, meu fiapo de vida esta nas mãos de remédios que fazem contrapartida ao veneno de tais insetos.

Segundo a lenda grega, Aquiles, filho do rei Peleu e da deusa Tétis, tornou-se invulnerável quando, ao nascer, foi banhado pela mãe nas águas do rio Estige. Apenas o calcanhar por onde Tétis o segurou não foi molhado e continuou vulnerável.
A exemplo do herói da mitologia grega, possuo vulnerabilidade. Bem verdade amplo e com infindáveis “inimigos”.

O evento fez-me refletir sobre nossa existência. Ainda que digam que somos poeira de estrelas, residentes de um pálido ponto azul, situado na periferia da via láctea e insignificantes frente imensidão do universo. Divirjo.
Somos o que desejamos ser, somos o que adoramos, somos a nossa carência do saber do compreender de querer ser protegido por uma força maior, somos a representação da capacidade de nos tornamos ilimitados, e o tempo?
O tempo é apenas um adereço pra impor limites, e barreiras pra cada coisa ter sua vez na ordem correta. Assim como a forma que a areia se organiza, ao passar pelo meio da ampulheta.

Renovei minha fé.


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Mini Mundo: Saudade

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No dia 30 de janeiro é comemorado o dia da saudade, essa palavra existe apenas na língua portuguesa e galega, serve para definir o sentimento de falta de alguém ou de algum lugar.

De origem latina, saudade é uma transformação da palavra solidão, que na língua escreve-se “solitatem”. Com o passar dos anos, assim como outras palavras se transformam de acordo com as variações da pronúncia, “solitatem” passou a ser “solidade”, depois “soldade” e, finalmente, saudade.

Reza à lenda que o termo foi cunhado na época dos descobrimentos portugueses e do Brasil colônia, quando esteve muito presente para definir a solidão dos portugueses numa terra estranha, longe de entes queridos. Define, pois, a melancolia causada pela lembrança; a mágoa que se sente pela ausência ou desaparecimento de pessoas, coisas, estados ou ações.

A memória de algo que aconteceu e que dificilmente voltara a acontecer da forma como foi na oportunidade, pode-se definir por saudade. O que aconteceu na madrugada de domingo dificilmente voltara a acontecer na forma como foi. A soma de descasos públicos e privados, em diversas instancias, criou a maléfica oportunidade de vitimar jovens brotando para a vida.
A corja, e o significado para corja é conjunto de pessoas desprezíveis, de má nota.  Indignos de serem considerados humanos, que ocupam cargos públicos, ou privados sedentos por lucro, que compram votos e vendem alvarás estão mobilizados na tentativa de reparar o irreparável. Ou pior: Nefastamente empurrando com a barriga suas obrigações pré e pós-tragédia. Setor publico e privado negligenciaram ações e agora se abstém da responsabilidade.
Talvez em incêndios em boates não morra mais ninguém no Brasil, mas o descaso e leviandade da escoria ira continuar nos vitimando nas estradas precárias, nos hospitais sucateados ou na falta dos mesmos, na segurança ineficiente, na base desqualificada da educação. Estamos entregues, rendidos, abandonados pela corja.

A inexistência de prevenção, somada a negligencia, certamente terá resultante caótica. Deficiências do Estado brasileiro (nas esferas federais, estaduais e municipais) e da classe política (todos os partidos, os ditos direita e esquerda) que somam e multiplicam problemas em seus respectivos setores. O Estado brasileiro se especializou em não fazer a prevenção ou, como diz o ditado popular, “cortar o mal pela raiz”. Sem prevenção, tragédias se repetem periodicamente.

O derradeiro jogo de empurra deslancha na impunidade. Após sermos apresentado as listas que ninguém desejava ler, esperamos pela terceira: a primeira de vitimas; segunda de feridos; terceira de punidos.
Corrupção, ausência de prevenção e impunidade não deveriam ser perpetuados em solo brasileiro. Aguardamos sob amparo do ditado popular: a justiça tarda, mas não falha.

Saudade é o que familiares sentem de seus jovens que tiveram o direito de viver negado, furtado, covardemente.

Espero um dia recordar este passado nebuloso e ter a agradabilíssima surpresa de viver em um futuro melhor. Mas nunca esquecendo as atrocidades de outrora. Pois, povo que não conhece a sua história está condenado a repeti-la.


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Mini Mundo: Professores (as) e dar nó

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Em 1996, durante período escolar, o pequeno Eduardo tinha seis anos. Estava no inicio de sua vida escolar. Lembro-me como se fosse ontem de que maneira aprendi a dar nó em tênis. Recordo-me também quem me auxiliou a enfim aprender esse gesto simplíssimo, mas, com seis anos, um bicho papão. Não me perguntam o porquê, mas este singelo ato de ensinar um pequenino a dar nó criou raízes em minha memória.

Tios e tias me confidenciam que, quando pequeno, eu era impossível. Ainda não descobriram qual a formula mágica de minha mãe para me acalmar. Minhas lembranças justificam alcunha de “pestinha”.

Corriqueiramente, quando o sino batia para encerrar o período, saíamos correndo para nos libertar da escola. Estudava no segundo andar e deveria descer três lances de escada. Descíamos de três maneiras: primeira e mais convencional, degrau por degrau; segunda, literalmente quicando a cada degrau, descíamos sentados; e, terceiro, usando a mochila como espécie de carrinho de lomba.
Acredito que, no dia em que aprendi a dar nó, desci entre segundo e terceira opção, pois, caso tivesse optado pela primeira um incidente grave tinha grande probabilidade de acontecer. Passado os lances de escada, a liberdade estava próxima. Cheguei ao corredor final e despontei pela porta. Naturalmente sai correndo. Porém, um grito freou meu ímpeto libertário: Eduardo! Volte já aqui!
Logo imaginei: fui injustiçado, ou, pegaram alguma infração de outrora. Matutava qual seria minha penitencia. Chamar meus pais?

Voltei-me para ver quem chamou. Meu pior pesadelo: diretora. Fui de encontro a ela cabisbaixo. Ela então falou: menino! Correr com tênis desatado. Você poderia ter se machucado. Não sabe amarrar os tênis?
Respondi que não. Então ela continuou: preste atenção. É só cruzar, passar por dentro e laçar eles.
Este simples ato revelou meu modelo de aprendizagem, preferencial: visual.
Desde então, jamais andei com cadarços esvoaçantes, sem nó.

Cito esta historia que aconteceu quando era pequenino para exemplificar o papel do professor. O modesto ato de ensinar um aluno a dar nó. Não subestimem a facilidade do ato. Hoje automático, mas com seis anos, de complexidade impar. Nesta idade “eduardinho” não possuía repertorio motor aguçado, sequer motricidade fina para comandar mãos e dedos.

O papel do professor é muito maior do que simplesmente passar informação ao aluno. As extensas horas com professor são de aprendizado para a vida, afinal de contas, na infância, ainda estamos sob-formação, alicerçando nossas personalidades e conhecimento. E, criação de hábitos e costumes passam pelas mãos dos pais, mas, inegavelmente, professores participam deste processo.

“O professor é o que nos ensina (ensinar é diferente de educar) tudo aquilo que utilizaremos para toda a vida. O professor é símbolo de aprendizado, mudança de mentalidade e desenvolvimento do raciocínio. O professor ensina, transmite conhecimento e habilidades Professores são mestres de suas áreas.” Wanderson Ferreira.

Pais e/ou responsáveis são os “pedreiros” que alicerçam os deveres morais e éticos de seus filhos. Pois, novamente abuso de minha memória. Em outrora o respeito pelo professor era algo inquestionável. Dentro da sala de aula o professor era unanime. Hoje, o aluno não respeita seu mentor. Bem como não respeitam pais e idosos. E, pior, decretam o futuro do professor sob-alegação que, quem mantém o educador é o aluno, no caso o pai. Uma completa afronta ao sistema educacional. Não que o professor esteja em pedestal, intocável. Mas julga-lo, indevidamente, por questões ligadas a notas e presenças é uma afronta ao sistema educacional brasileiro. A educação, sim, deveria vir de casa. Se não vem, estão deturpados nossos conceitos de educar e ensinar.