O Barrense


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Mini Mundo: Comitiva barrense nos Estados Unidos

Minu Mundo coluna

Reza a lenda que uma comitiva barrense rompeu barreiras sociais em solo americano.
O causo aconteceu entre as décadas de sessenta e setenta, quando empresários decidiram rumar à terra do Tio Sam com objetivo de comercializar os grãos produzidos no município. As portas até então estavam fechadas para comercio internacional, sem contar que receberiam em dólar.
Um só granjeiro não somaria quantia necessária para importar e ainda obter lucro, portanto, uma comitiva formada por seleto grupo de “barões” rumou aos Estados Unidos.

Evidentemente a viajem tornou-se um marco na época. Barrenses com destino aos Estados Unidos, e pasmem, comercializando nossos produtos. Alguns permaneceram céticos frente ao sucesso, outros empolgados sob-perspectiva de receber em dólar. Porém, ninguém previu o impacto gerado, em solo americano, por comitiva do interior do Rio Grande do Sul.

A “trupe” iniciou sua jornada e, ao pisar em solo americano, um guia os esperava. Apresentou a cidade, cultura norte-americana, lugares a serem frequentados e etc. Mas, uma peculiaridade americana não passou despercebida. Dentre tantos, um audaz empresário indagou o porquê de caminharem por apenas uma das calçadas. O guia então respondeu que havia diferenciação entre cidadãos de tez escura e clara. Portanto, calçadas, estabelecimentos, escolas e outras tantas instituições visivelmente “adaptadas” as condições impostas pelo preconceito.
O ceticismo pairou sob os granjeiros. Negavam-se a acreditar. Foi quando, repentinamente, um os granjeiros destoou dos demais, cruzou a rua, e passou a caminhar na calçada destinada aos negros. O guia, americano ou brasileiro habituado aos preceitos norte americanos, surtou. Considerou tal atitude uma afronta às normas sociais americanas. O brasileiro seguiu caminhando e, ainda mais surpreendentemente, entrou em restaurante, obviamente destinado a negros. A comitiva seguiu o impetuoso conterrâneo. Inicialmente o chefe do restaurante, naturalmente negro, surpreendeu-se frente ao grupo em seu restaurante. Mas foi rapidamente persuadido pelo barrense. O brasileiro argumentou que em sua terra natal não havia racismo. As calçadas eram para todos, sem diferenciação. Ainda ressaltou que as profissões em sua granja independiam de “raça”. O chefe sensibilizou-se e serviu o melhor prato para a comitiva.

O guia embasbacado não reagiu. Seu baixo e racista intelecto considerou uma afronta aos padrões sociais de época. Porém, a comitiva realizava o mais nobre ato para frear e desmoralizar o racismo.
Se a sociedade americana, e porque não a brasileira, considerava racismo algo a ser extinto, agiam hipocritamente. Os americanos, em suas atitudes, desmerecem o árduo trabalho de Abraham Lincoln.

Cidadãos de terceiro mundo, civis de um país subdesenvolvido apresentaram o cartão de visitas brasileiro: aversão à discriminação racial.

O causo ganhou notoriedade na cidade. Pudera, um interiorano barrense enfrentou a toda uma sociedade e seus preconceitos arcaicos com singelo ato de atravessar rua e alimentar-se em restaurante. Barrenses quebrando paradigmas em solo norte-americano. Quanto aos negócios? O maior tratado foi demonstrar, em atitudes, a ojeriza ao racismo.

De fato, estes foram tempos nebulosos que deixaram cicatrizes na historia mundial.
A “trupe” brasileira quebrou paradigmas. Suspeito, e ainda mantenho-me cético, que norte-americanos consideram e consideravam America Latina residência de seres desprovidos de inteligência. Estes nobres tupiniquins responderam à altura. Um basta ao racismo perpetuado.

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Se, no decorrer do texto, passei impressão que não há racismo em solo brasileiro, me perdoem. São 386 anos de escravidão. Décadas e décadas de violência policial racista e exclusão. 512 anos de discriminação.
Não que o racismo em terras tupiniquins foi abolido, talvez “formalmente”. Um cidadão que não teve acesso a boas escolas desde o berço e encara o lado desagradável da pirâmide social logo depois de abrir os olhos é incapaz de raciocinar sobre sua condição e compreender que enfrenta dificuldades pelas quais não tem a menor responsabilidade como indivíduo, mas como herdeiro de uma estrutura social desigual e injusta.

O dito causo ocorreu durante ditadura militar, cujo governo ficou reconhecido por polarizar classes sociais. Pós-ditadura governos democráticos adotaram ações afirmativas como métodos de frear desigualdade social e discriminação racial. O empresariado surpreendeu por, durante regime militar, demonstrar em atitudes aversão ao racismo.