O Barrense


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Austrália, terra do canguru e rúgbi, tem centroavante, e nós?

Brazil Soccer WCup Chile Australia

Quarta-feira é sinônimo de futebol no Brasil, durante a Copa, atenua-se esse ritual, a overdose de jogos permanece. E Porto Alegre amanheceu com tons de laranja e amarelo. Dum lado a badalada seleção Holandesa, que patrolou a então campeã mundial Espanha. Do outro, feito franco atirador, a Austrália, que surpreendeu frente ao Chile, mas não o bastante para alcançar a vitoria.

Imaginava-se uma Holanda arrebatadora. Uma goleada retumbante da laranja mecânica em solo gaúcho. Seria natural após a aula sobre a Espanha. E Robben nos levou a crer nisto logo aos dezenove minutos, após arrancar do meio-campo e só parar com a bola na rede.

Porém, havia um tal de Cahill na Austrália. Centroavante que joga com a numero quatro as costas que logo tratou de empatar, aos vinte e um, sequer deu chance pra Holanda comemorar.

– Que gol foi esse?
– Gol de copa.
– Golaço. Nem parece australiano, deve ser a influencia do solo tupiniquim.
– Qual o nome do sujeito?
– Cahill.
– Centroavante com a camisa quatro? Heresia.
– Heresia é ter Fred usando a nove da seleção.
– Ao menos ele interpreta bem…
– Escola brasileira de atores é renomada…
– É, pra você ver, a Austrália, aquela ilha banhada pelos oceanos pacífico e índico, conhecida pelo Rúgbi e Cangurus, tem centroavante, nós, o país do futebol, não.
– E digo mais: Cahill não é centroavante.
– Não?
– Não. Na Inglaterra ele era meia central, algo próximo do nosso segundo volante. Na seleção é centroavante pela impulsão e experiência.
– Só atenua o caso. Fred é o retrato da FALÊNCIA DA CENTROAVÂNCIA no futebol brasileiro.
– É jogador terminal: se sobrar ele guarda. Joga no erro do adversário.
– Centroavante da seleção brasileira não pode esperar o erro do adversário. Inadmissível.
– Concordo, mas se não ele, quem?
– …
– Teu silencio é aterrorizante.

A vitoria holandesa se confirmou, não da maneira imaginada.


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Fernandão e o gol mil

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O dia é 10 de julho de 2004, dia de GRENAL, o maior clássico da terra. Num frio e nublado sábado, o Beira-Rio pulsava, como é de hábito. Além do clássico, que por si só é um atrativo, havia a possibilidade de marcar o tento 1000 em grenais.

Torcedores eufóricos apostavam o que tinham, e o que não tinham, em quem marcaria o milésimo gol em clássicos.

Entre colorados, no Pré-jogo:

– Apostou em quem?
– No recém chegado: Fernandão!
– Mas ele começa no banco, corre o risco de nem fardar.
– Todos correm algum risco. E tu? Apostou em quem?
– Rafael Sóbis. Atacante sinuoso. Bilica e Claudiomiro ficarão mais perdidos que cego em tiroteio.

O juiz apita o início do jogo. Clássico morno. Quarenta e cinco minutos da etapa inicial de times cautelosos, estudando cada movimento do adversário.

Durante o intervalo:

– O destino nos reserva algo especial para esse segundo tempo.
– Mãe Diná?
– Instinto.
– O mesmo que te levou a apostar no Fernandão?
– Sim!

Durante o intervalo jornalistas comentavam do recém chegado ao Internacional: Fernandão.

– A novidade do Inter está a disposição para esse segundo tempo: Fernandão. Contratado juntou ao Toulouse, da França, e regularizado apenas na sexta-feira.
– Com um metro e noventa centímetros sua principal característica deve ser o cabeceio, heinho?
– Exatamente, Brito. E a curiosidade é que ele tem uma placa de titanio na testa.
– Placa de titanio?
– Exatamente. Devido a uma lesão.
– Placa de titanio, já tinha visto dessa, Batista?
– Nunca. É a medicina nos surpreendendo, Brito.
– Que coisa. Testas de titanio à parte, começa o segundo tempo.

A etapa complementar começa movimentada: Quando Vinícius, aos oito minutos, abriu o placar após cobrança de falta de Alex, bastava outro tento para o Gre-Nal chegar ao seu milésimo gol.

Após ziguezaguear entre zagueiros, e de fato atordoa-los, Rafael Sobis deixa o campo extenuado.

– Não! Não, Joel! Deixa o guri em campo.
– Hehe.
– Tá rindo de que? Fernandão sequer entrou em campo.

De fato ele não estava, questão de tempo, pois o recém-chegado já recebia orientações de Joel Santana para ingressar na partida.

– Até que enfim, Joel!
– Só faltava essa.
– Anota aí: Fernandão e sua testa de titanio marcarão o gol 1000.
– Existe uma diferença sutil em entrar e marcar.
– Secando o Inter?
– Não! Um a zero está ótimo. São três pontos de qualquer maneira.

Aos 33 minutos, pelo flanco direito, o lateral Elder Granja cruzou para ele , Fernandão, subir entre os zagueiros gremistas, cabecear de maneira certeira e decretar uma vitória histórica.

Ambos se abraçam e comemoram o segundo gol, o gol mil.

– Eu já sabia! Eu já sabia! Eu já sabia!
[o segundo torcedor se da conta e pausa sua comemoração]:
– Não acredito!
– Que cabeçada! Ele tem estrela. Milésimo gol em grenais logo na estreia.
– Diferenciado.

O dois a zero permaneceu no placar. Vitória colorada.

– Fernandão, esse vai fazer história no Inter.
– Já fez.
– Amigo, esse é apenas o começo de uma nova era.
– Nova era? Como tu sabe? Instinto?
– Quase isso.
– Vou cobrar, hein?!


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Gremistas conversam

 

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– I-NA-CRE-DI-TA-VEL.
– O que?
– Empatar com o Palmeiras em casa.
– Alfredo Jaconi não é nossa casa.
– E justifica? Torcida compareceu, apoiou, e nada do time convencer.
– A parada pra Copa deve acomodar as melancias na carroça.
– Falando em parada, os vermelhinhos terminaram o campeonato na nossa frente.
– E com time repleto de desfalques. Imagine com time completo…
– E Enderson tirando leite de pedra pra chegar em sexto…
– Nosso elenco é limitado, mas com reforços, quem sabe onde poderemos chegar.
– Você se lembra do Marcio Braga, ex-presidente do Flamengo?
– Claro!
– E do teorema dele?
– Não, diga!
– “Acabou o dinheiro! Não tem dinheiro! Estamos em crise”.
– Mas e os trinta milhões de euros no cofre?
– Você realmente acreditou nele?
– Se não confiarmos em nosso presidente, em quem devemos acreditar?
– Bem, só acredito vendo.
– É o que nos resta após gestões desastrosas.
– Quem diria que dependeríamos tanto do futebol fora das quatro linhas.
– E nas mãos de cartolas.
– Com interesses dúbios.

O cenário é desolador. Clube em frangalhos economicamente. Dentro do campo o torcedor precisa suportar Pará, Barcos e cia. Na casa-mata um treinador inerte. A esperança é que Fabio Koff reedite o Grêmio copeiro da década de 80 e 90.

O temor tricolor continua:

– O que tu acha do Nepal no fim do ano?
– Não tenho a minima ideia…
– Será que funciona rádio?
– Que pergunta é essa?
– Só responda: funciona ou não?
– Provavelmente não.
– TV?
– Não!
– Internet?
– Não!
– Jornal?
– Raios, provavelmente não.
– Hum, obrigado.
– Tá, mas porque tudo isso?
– Lembra-se dos anos 70?
– Lembro por quê?
– Especificamente, lembra-se do cenário futebolístico aqui no sul?
– E como não lembrar? Vivemos o inferno na terra. Os vermelhinhos vencendo tudo e à todos.
– Então, to indo agora marcar meu voo pro Nepal. Sabe, algo me diz que aquela época esta voltando.
– Qual companhia? Acho que vou também…


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Manteiga de cacau

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Numa farmácia na rodoviária de Porto Alegre…

– Boa noite, pois não?
– Boa noite! Tens manteiga de cacau? (Já visualizando o tubo de manteiga de cacau, próximo a máquina registradora)
– Claro. Do Inter ou do Grêmio?
– Grêmio.
– Tem certeza?
– Porque não teria?
– Dizem que essa cai a boca.
– E a outra?
– A cura de todos teus males.
– E custa quanto?
– Três e… – não o deixo completar a frase.
– Três cruzeiros? Amargo, hein?!
– Engraçadinho…
– Qual o valor dela mesmo?
– Três REAIS e noventa centavos.

[pego o tubo do Grêmio e pago o valor]

– Pode ficar com o troco.
– Obrigado. Mas antes de ir embora, posso me certificar de uma coisa?
– Diga.
– Tens certeza da tua escolha? Quer trocar? Pense bem, não é sempre que abro essa exceção, mas o teu caso é especial.
– Na vida só tenho três certezas: na morte; no amor; e na defesa do Grêmio.
– Logo a defesa?
– O melhor ataque é a defesa.
– Inclui goleiro?
– Claro!
– E tu confia no Grohe?
– Tanto quanto tu confia no Dida.
– Sempre tenho um pé atrás com goleiros, com o Dida tenho os dois.
– Nenhum outro jogador transita como o goleiro entre a santificação e o abismo, às vezes de um instante para o outro.
– Concordo. Diacho de posição ingrata. Só os centroavantes se equiparam a eles.
– Não me fala em centroavante.
– O pirata da perna de pau?
– De olho de vidro… Ele mesmo. Pagamos uma fortuna por esse desalmado, por essa gangrena gasosa, espírito sem luz.
– Não vale um tostão furado. Uma uva.
– Uma? Aquilo é um parreiral. É um Dimba com grife.

Então surge outro cliente, e o atendente prontamente vai atende-lo.

– Vou te deixar trabalhar.
– Certo, e boa sorte com o Barcos.

Pensei: “sorte? Tai uma coisa que deve ser antagônica ao grêmio. Ou abandonou o clube por completo, ao menos na ultima década.”


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Ganso e Grohe deviam estar na seleção

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Não existe nada mais cruel para o torcedor que futebol na noite de sábado. É desumano – a não ser que você seja casado, então você terá 90 minutos de sossego, quiçá a única alegria no final de semana. Futebol aos sábados é certeza de casa vazia.

Independente do horário da partida, lá estavam vinte e dois jogadores perfilados para correr atrás daquele objeto esférico feito de couro.

Após estupendo passe de Ganso…

– Ao que parece Ganso reencontrou o bom futebol…
– Merecia vaga na seleção.
– Ejaculação precoce você, hein?! Ele vem na crescente, mas esteve tempo demais no ostracismo. Precisa se firmar.
– Não temos um “10” clássico entre os 23. Aquele organizador, quem “pifa” o centroavante. E você sabe, eu sei, a torcida do Flamengo sabe, Fred precisa de um garçom, caso contrario, é só mais um cone em campo.
– Oscar pode ser esse organizador.
– Não vamos nos enganar. Oscar é bom, mas não é Ganso. Aliás, jogadores como Ganso estão em extinção.
– Camisas “10”?
– Jogadores que jogam de cabeça erguida. Do passe refinado. Ganso é o canto do cisne da classe.
– Estão em extinção pela inércia em campo. Você não percebe? Não há espaço pra quem não participa da fase defensiva.
– E craque precisa marcar?
– Claro!
– O “futebol moderno” ainda vai matar o futebol que conhecemos. Ora essa, craque marcar. E pra que serve o volante? Perfumaria?
– Por esse pensamento retrogrado que o futebol brasileiro passa por vexame como Mazembe’s e Raja’s da vida. Futebol é conjunto. Organismos vivos.
– Organismo vivo?
– Quando se acomoda, corre riscos de não evoluir.
– Futebol é muito simples: quem tem a bola ataca; quem não tem defende.
– Perfeito! E isso se estende a todos os jogadores, correto?
– Nem todos. Craque não marca: joga. O craque precisa estar com pernas para ter forças para decidir.
– E pra compensar essa lacuna o treinador escala aquele brucutu frente à zaga?
– Exato.
– E você acha isso perfeitamente normal?
– Absolutamente.

O silencio imperou durante algum tempo. Um deles sabia que não havia porque prosseguir com a discussão. É de conhecimento geral que o tolo rebaixa você ao nível dele e vence a discussão por ter mais experiência na mediocridade.

O marasmo deu lugar ao êxtase quando Marlo Grohe opera grande defesa:

– Me passa o numero do Vaticano.
– Pra que?
– O Papa precisa canonizar o Grohe.
– O jogo só termina quando acaba. Elogiar goleiro e arbitro antes do apito final é temerário…
– Temerário? Você viu ele contra o Fluminense?
– Jogo perfeito, mas passou.
– Tu sempre com o pé atrás, deixa de desconfiança.

O arbitro apita o final do primeiro tempo. Tudo igual no Morumbi. Jogo pegado, duas equipes de qualidade – para o nível do brasileirão. São Paulo levando perigo ao gol de Marcelo e Barcos perdendo as poucas chances criadas pela equipe gaucha.

– Esse Barcos tá mais pra canoa.
– Não sei o que ele quer fora da grande área, não é a dele.
– Jogar futebol não é a dele.
– Precisa de um curso intensivo com Jardel.
– Ou André Lima.
– Não exagera.
– Ao menos sabia seu lugar e o principal: fazer gol.
– Cara, André Lima é desespero.
– E Barcos?

Outra discussão que não valia o esforço. André Lima jamais será solução pra coisa alguma.

Eis que o Ganso, em cobrança de bola parada, ergue bola para grande área e… Gol do São Paulo. Lucas Silva após falha de Grohe.

[silencio]

[pigarreia] Bela cobrança do Ganso.
– …
– Goleiro vai do céu ao inferno em questão de segundos…
– Cara, tu zicou o Grohe. Boca santa.
– Agora a culpa é minha?
– Tua e das viúvas do Dida. Colocam olho gordo no rapaz.
– Nada que um banho de sal grosso não resolva.

O 1×0 se mantém no placar e o tricolor paulista confirma a vitoria. Para metade do Rio Grande do Sul o restante da noite de sábado será tediosa, ingrata. E o domingo pode ser ainda pior: vitoria do coirmão.

Sábado a noite não é dia de futebol, definitivamente.

*aos 48 da etapa complementar Barcos perde um gol daqueles…

[ambos colocam a mão na cabeça, fecham os olhos, xingam até a terceira geração do centroavante tricolor]

– Pirata perna de pau.
– I-NA-CRE-DI-TÁ-VEL.
– Demissão por justa causa.
– Heresia a classe de centroavantes.
– E ainda pagamos por essa ameba?
– Um caminhão de dinheiro.

#VoltaAndréLima


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Fred Bigode, o centroavante da seleção

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Domingo sempre reserva algo especial aos brasileiros. Num período de tempo especifico, o dia se torna antagônico ao que ele é naturalmente. De apático e depressivo a momentos de euforia e alegria (ou também de estresse continuo e crescente, que agrava o clima tipicamente de domingo). O relógio irá badalar quatro vezes e lá estará você, sentado à frente de uma caixa retangular que apresenta pequenos seres-humanos correndo atrás de um objeto esférico. Você grita, esbraveja, orienta, mas eles seguem te ignorando.

– Então é hoje que jogamos contra o centroavante titular da seleção?
– É!
– Que decadência, não acha? FRED?
– Fred Bigode.
– Porque Fred Bigode?
– Ele adotou o Bigode.
– Não pode. Ele não tem o perfil pra usar bigode.
– Agora é preciso de perfil pra ter bigode?
– Claro! Acima de tudo caráter. E veja onde o Fred joga: FLUMINENSE! Não combina.
– Analisando por essa ótica.
– E não há outra. Deveriam proibir os jogadores do Fluminense de usar o bigode, pelo menos até que paguem a Série B.

O arbitro autoriza o inicio da partida. Bola Rolanda na Arena Grêmio. Os minutos passam, Marcelo Grohe opera alguns milagres, ambos comentam que Felipão devia convoca-lo; Fluminense surpreende ao acuar o Grêmio no seu campo. Eis que, gol do Grêmio Rodriguinho. Comemoram! Intervalo.

– Na trupe dos bigodeiros, Valdir Bigode jogava mais que Fred Bigode.
– Didi, o folha seca, também.
– Zenon.
– Sócios de renome.
– E Fred, não contente em desgraçar a camisa nove da seleção, difama a entidade bigode.
– Culpado é quem convoca ele, futebol brasileiro está numa entressafra de centroavantes.
– Pois é. Pato, herdeiro natural da nove, se deixou levar pelo brilhantismo extra campo.
– Além do olho gordo da Steffany Brito.
– Nada que um banho de sal grosso não resolva.
– Pelo menos ele não adotou o bigode.
– Sabe que seria execrado pela classe.

Fred disputa bola com Bressan, B-R-E-S-S-A-N, e perde.

– Estamos bem servidos de centroavante.
– Pois é, e se Werley e Bressan conseguiram anular o Fred, imagine os beques da Copa.
– Quero nem imaginar. Se bem que Fred é avante do tipo oportunista: se sobrar ele guarda. Joga no erro do adversário.
– Impossível se contentar com Fred quando tivemos Romário e Ronaldo na referencia.
– E o que dizer do reserva? Jô.
– Jô, aquele? Ex- Inter?
– Ele mesmo.
– Que os deuses do futebol nos abençoem.
– Não te esquece: o Papa é argentino.
– Mas Deus é brasileiro.

Tônica do jogo: Fluminense pressionando e Grêmio contra-atacando. Em jogo de centroavantes de renome – Fred e Barcos – quem brilha é Marcelo Grohe, arqueiro gremista, protagonizando defesas espetaculares.

– Ei, Fred, aqui tem goleiro nível seleção!
– Tenta outra, bigode!
– Defesa à la Gordon Banks, hein?!
– Cabeçada à la Pelé.
– Não cometa essa heresia com o Rei do Futebol.

Eis que, aos vinte e dois minutos da etapa complementar, Fred confunde futebol com MMA e aplica um “estrangulamento” em Alan Ruíz e é expulso.

– Que isso Fred, violência não leva a lugar nenhum.
– Leva, pra seleção.
– Hehehe, verdade.
– Ou seria a malandragem à brasileira?
– Malandragem à brasileira? Qual o beneficio de ser expulso?
– Férias. Não joga a próxima rodada e tira uns dias de folga antes de se apresentar a seleção.
– Mau-caráter.
– Como te disse: não faz jus ao bigode que tem. Que Felipão, homem que honra a classe, trate de colocar ordem na casa e o obrigue a raspar o bigode.
– É isso ou #NãoVaiTerCopa.

Apito final. Vitoria do tricolor gaúcho. Até o próximo domingo (sem Fred e seu famigerado bigode).


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Fofinho, O centroavante

O cigarro ardia entre seus dedos. Mestre na arte de vencer os anos, com olhos de rapina, segurando a CATRONCA e mirando o campo. O que temos é um caudillo que, com semblante sereno, está prestes a tomar GRAVES decisões, talvez até mesmo envolvendo degolas, imaginando como cortar o zagueiro ou outras chacrinhas bélicas. Nem por isso, nem pela GUERRA que se avizinha, no entanto, ele se deixa abater ou mostra agitação. Continua ali, impávido, fingindo uma sabedoria que talvez não tenha, prescrutando a imensidão.

Sua fiel escuderia ao seu lado: as chuteiras. Um par de chuteiras de couro. Negras. Nada de cores espalhafatosas, é um centroavante à moda antiga. Que honra o numero as suas costas. O reconheci pelo desgaste natural do couro na extremidade da chuteira, o dito “bico”. Típico sintoma do centroavante: chutar, da maneira que vier, de onde vier.  Porque não existe gol feio, feio é não fazer gol.

“Não sei por que dizem que chutar de bico é coisa de perna de pau”, Romário.

O sujeito estava descalço, com as cicatrizes oriundas de batalhas inenarráveis a mostra. Imagino que zagueiros insaciáveis pela carnificina “botinaram” seu calcanhar, sua canela. Ali estava um verdadeiro centroavante. Destes que você encontra quatro ou cinco vezes na vida. A malemolência estava presente em cada palavra dita. Nos seus gestos. O olhar. Tudo remetia a características tipicamente “centroavantianas”.


Eles são difíceis, os centroavantes.

Se lhes perguntarem: “Conhece um bom centroavante?”, terão que responder:

– Só conheço eu mesmo.

Você os conhece de longe.

Centroavantes, toureiros velhos e mecenas. São sobreviventes. Contam-se nos dedos. Estiveram com a morte e voltaram, e têm as cicatrizes para provar. O jeito desconfiado, os gestos tensos, o cigarro nos dedos nervosos, os olhos cansados, você os conhece.


Ali estava eu, na presença de um destes seres. Ah, o centroavante. Narcisista, por sinal. Falava apenas de si. E como falava.

– Então, Fofinho, final amanhã! – disse um de seus companheiros de equipe, aparentemente tenso.

Vagarosamente ele levou o cigarro aos lábios. O olhar perdido no horizonte. Cristalizado. Tragou e volveu seu olhar ao jovem rapaz. A espeça nuvem do cigarro entre ambos:

– Garoto, este jogo é como outro qualquer. Apenas toque a bola pro Fofinho e ele resolve.

Sim! Centroavantes falam de si na terceira pessoa. Como se fossem outra pessoa em campo.

Antes que você me pergunte, lhe respondo: Sim! Fofinho não é nome de centroavante. Talvez esta tenha sido a razão pela qual Fofinho estava jogando na várzea. O apelido não passa credibilidade. Centroavantes carecem de nome composto: Luís Fabiano, Leandro Damião, coisa do tipo. Ou de apelido imponente: Hernane “Brocador”, Adriano “Imperador”, Ronaldo “Fenomeno”, Dadá “Maravilha”, Tulio “Maravilha”. Ou apelidos do tipo: Edmundo, o Animal; Donizete, o Pantera; Santiago Silva, El Tanque.  Mas Fofinho? Não! De forma alguma. Imagine se Pelé fosse chamado Fofinho, com certeza não seria o mesmo.

– Vocês não precisam se preocupar. É só um jogo de futebol. Vinte e dois jogadores correndo atrás da bola. Querem saber? Vou sair essa noite, beber, fumar, transar e… jogar amanhã. Marcar meu gol e sair campeão. Relaxa, rapaziada, Fofinho se garante. Ah, espera ai que vou pegar uma gelada – e lá foi Fofinho, o andar cambaleante, vagaroso.

Fofinho tinha personalidade. Brincava com as palavras bem como brincava com os zagueiros. E exercia sua função como poucos. A arte de marcar gols. De superar zagueiros. De fuzilar as redes, de não ter dó do goleiro. Ser centroavante.

Ele esta de volta, agora com o copo de cerveja em uma das mãos e o cigarro em outra.

– Rapaziada, a melhor fase da minha carreira foi quando joguei no Uruguai. Ganhava em dólar. Salário em dia. O presidente entrava no vestiário com a maleta recheada de dólar e pagava o grupo. Fofinho ganhava um adicional por gol, o famoso “bicho”. E como eu fazia gol. Caramba! Não entendia nada do que eles falavam, nem eles me entediam, eu só tinha que marcar gols… Ganhei dinheiro nessa vida. A turma da pesada ia toda pro cassino. Gastei tudo que ganhei, mas valeu.

Após sua fala, bebeu da sua cerveja, deu uma beliscada no cigarro e silenciou. O que tinha para dizer estava dito.

– Vou pra casa, descansar pra noite. Comemoração antecipada – disse ele, despedindo-se.

Estivera eu na presença de um centroavante de oficio. Cujo propósito sobre a Terra é marcar gols, mas também é quem mais perde gols, e assim trai o seu destino. Nenhum outro jogador transita como o centroavante entre a santificação e o abismo, às vezes de um instante para o outro.

Os caminhos do gol estão traçados no gramado há anos, desde os primeiros ingleses, e a única coisa a fazer era descobri-los. O avante sabe fazê-lo com maestria. Conhece cada vereda e viela, as tem calejadas na palma da mão.
Residir na grande área, por vezes solitário, um local insalubre, tremendo, é incumbência para poucos.

Fofinho, o centroavante sem nome. Mas ainda centroavante.

Ah, quanto a grande final? O time de Fofinho foi campeão. Um a zero. Dizem que Fofinho deitou. Não marcou por tarde inspirada do goleiro.


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Jardel e o gol, como ludibriar o zagueiro

Os caminhos do gol estão traçados no gramado há anos, desde os primeiros ingleses, e a única coisa a fazer era descobri-los. O avante sabe fazê-lo com maestria. Conhece cada vereda e viela, as tem calejadas na palma da mão.
A malemolência é inerente a sua formação. Afinal, é preciso. Residir na grande área, por vezes solitário, um local insalubre, tremendo, é incumbência para poucos.

Eles são os personagens centrais do espetáculo chamado futebol, pois se não cumprirem a missão que lhes foi dada em campo, são execrados pela torcida. Fazer gols é a missão de todo centroavante, o camisa 9, o homem gol. Pouco importa onde joga, mas quando veste a camisa 9, de qualquer time, seleção ou timinho de várzea, tornam-se seres especiais.

Sem mais delongas, apresento-lhes o sujeito desta crônica: Mario Jardel. Reza a lenda que em sua carteira de trabalho consta “centroavante” na lacuna “profissão”.

Certa feita Jardel fora indagado a revelar seu segredo de como se desvincular da marcação feroz dos zagueiros. Defensores que desferiam incansáveis botinadas em seu calcanhar. Jardel assim respondeu:

– A esse respeito tenho uma historia danada de boa. Estava jogando no Porto, campeonato português. Modestamente, adquiri reconhecimento em pouco tempo, em virtude de meus gols. O ônus dos gols trata-se da marcação forte. Corpo a corpo. E num certo jogo, em que não havia marcado gol ate então, e o zagueiro colado em mim, resolvi inovar.

– Inovar, Jardel?

– Não tinha jeito. O danado me perseguia. Além de querer operar meu tornozelo e joelho. Mas voltando a inovação… A jogada era pelo flanco direito. Nosso lateral vinha rompendo a beirada. E eu na entrada da grande área, o zagueiro agarrado comigo. Ate o ar se tornou escasso. Dividíamos cada palmo do campo. Percebi que o zagueiro me olhava nos olhos. Não tirava os olhos de mim, ignorava a partida ao seu redor. De canto de olho vi o lateral mergulhando pra linha de fundo, pensei “é agora ou nunca”. Driblei o beque com os olhos.

– Com os olhos? Como assim?

– Simples. O lateral vinha correndo, e o cabra era bom no cruzamento. Jogo truncado, segundo tempo. Era minha chance. Então fingi com olhos que estava acompanhando a bola em um cruzamento, como se o lateral houvesse cruzado e a bola estivesse passando pela grande área, o zagueirão fisgou a isca, acompanhou meu olhar e virou o rosto pra acompanhar a bola e enquadrar o corpo.

– E qual o truque, Jardel?

– O lateral não tinha cruzado, ainda. Por sorte, ou trabalho em equipe (hehehe), quando o zagueiro virou o rosto, tirando os olhos de mim e procurando a bola, avistei o lateral na linha de fundo, cruzando. Rompi pela grande área, desvencilhando-me do zagueiro e cabeceando a bola para o gol. Voei na bola. Deixei o zagueiro comendo poeira e o goleiro “paradão”, nem viu a cor da bola. Gol. Ganhamos o jogo por 1×0.

– Pô!, Jardel, coisa de outro mundo!

– Pois é, o momento pedia algo do tipo. Tive que criar uma situação.

– E de cabeça? Clássico do Jardel. Figurinha tarimbada no seu hall de jogadas.

– É! Era meu ponto forte. Impulsão, cabeçada, “timing”. Como diria Dadá Maravilha “pairar no ar”. Coisa que poucos conseguem.

– Você era mestre.

– Tinha que ser já que era desprovido de qualidade com a redonda no chão. Compensei na bola aérea.

– Não se fazem mais centroavantes como antigamente…

– Modéstia a parte, não mesmo. Estão ate querendo acabar conosco. Dizendo que é causa perdida nos manterem em campo.

– Jardel, nenhuma causa é perdida se tivermos um só tolo pra lutar por ela.


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Dissecando o centroavante

Pode soar démodé, mas centroavantes fazem a diferença. Abundantes em outrora, fadados à extinção em futuro não muito distante. Motivo? Necessário, mas nada romântico. Um baixinho que transborda genialidade; atua no campo de ação do centroavante; possui alcunha de falso-nove. Não é uma clara afronta? Messi aos poucos vai jogando as derradeiras pás de cal no centroavante de oficio.

Se na Europa o nove cai em desuso, ou se “reinventa”, em solo tupiniquim possui vaga cativa no onze inicial. Decreto presente na constituição federal: não ousem iniciar partida de futebol sem centroavante dentro das quatro linhas. Esta “cultura europeia” não deve seguir atrevimento de Cabral. Que permaneça no antigo continente e não atravesse o atlântico.

Lutar pela existência do centroavante é causa perdida? Nenhuma causa é perdida se tivermos um só tolo pra lutar por ela

O camisa 9, centroavante, matador… Utilize a alcunha que desejar. Há uma mística em torno deste clássico jogador, mesmo não usando a “9”, uma afronta ao futebol, ou não sendo um típico “9”.
O “9” tradicional perambula pelos meandros do futebol, independente de esquemas.
Habita a grande área, seu habitat natural, o qual divide com sua presa/predador, o zagueiro. Com o futebol em evolução, o avante segue em sua nau, blindado pelos demais, indiferente a teorias da evolução.

O decreto de atuar com um centroavante ainda perdura. Sua missão é desbravar campos verdejantes em busca do gol.
É o rei da área, chama a responsabilidade para si, bem como preocupação dos adversários.

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Em campos de várzea ou arenas colossais, certamente ele esta presente. Trata-se de um personagem folclórico: O centroavante. No gramado é facilmente reconhecido: sua anatomia é “canélica”; andar desengonçado; olhar ao longe;

Os caminhos do gol estão traçados no gramado há anos, desde os primeiros ingleses, e a única coisa a fazer era descobri-los. O avante sabe fazê-lo com maestria. Conhece cada vereda e viela, as tem calejadas na palma da mão.
A malemolência é inerente a sua formação. Afinal, é preciso. Residir na grande área, por vezes solitário, um local insalubre, tremendo, é incumbência para poucos.

Richard Bach imortalizou o que é ser centroavante:

Eis um teste para saber se você terminou sua missão no futebol: se você está vivo, não terminou.

Poste

Este habita exclusivamente a grande área, quando não esta nela é um peixe fora d’agua. Seu forte é a bola aérea, da maneira que ela vier. Tem imposição física, jogador alto e que prende marcação dos zagueiros. É referenciado time para cruzamentos rasantes, chuveirinho, escanteios e faltas.

Exemplo: Marcelo Moreno…

Trombador

Assim como o poste, joga na área, porem, quando é lançado usa de seu avantajado porte físico para combater seus marcadores. Seu codinome é força. Não esbanja qualidade técnica; característica marcante é tapear a bola a frente e dividi-la ombro a ombro.

Exemplo: Adriano Imperador (em seus áureos tempos)…

Pivô

Não se engane, o pivô nos brinda com sua presença no futebol, apesar de ser figurinha carimbada no futsal e basquete.
Obviamente joga de costas para o gol. Sua função é básica, há duas opções: reter a posse de bola e aguardar companheiros; receber de costas e girar finalizando.
Possui maior liberdade de movimentação. Flutua entre meio campo e ataque, puxando consigo a marcação e abrindo brechas.

Exemplo: Borges, Kléber Gladiador, Jô…

Velocista

Peça rara entre avantes. Quem o tem o guarda a sete chaves. Seu posicionamento é entre os zagueiros, endiabrando adversários com sua velocidade descomunal. Abusa de lançamentos e passes em profundidade. Seu ziguezaguear atordoa o time adversário.

Exemplo: Nilmar…

Técnico

Arquétipo de centroavante. Semideus em campos de futebol. Reza a lenda que o Deus máximo do futebol os cria para, de tempos em tempos, revitalizar o futebol, para não perdermos a fé. Seus pés transbordam lances geniais, inacreditáveis, extrapolando o sobrenatural. Midas do futebol, tudo que toca se torna ouro, no caso, lances de extrema plasticidade.
Não se trata de peça rara, é único.

Exemplo: Ronaldo…

Matador

Casamento perfeito, amor à primeira vista. O estilo cafajeste atrai a esférica. Os opostos, realmente, se atraem. Pouco importa a maneira que ela vem, é caixa na certa. Entenda: você, em hipótese alguma, pode retira-lo na partida, pois, bem como o ferro atrai o imã, o centroavante atrai o gol, alias, tem cheiro, faro de gol.
Não tem característica física ou técnica definida. Um mistério para ciência.

Exemplo: Romário, Jardel…

Oportunista

Uma incógnita. Não se sabe o porquê de existir. Não há teoria compreensível do porque ainda perdurar. Sim! Deveria estar extinto. Frivolamente jogar por rebotes e erros do adversário. Atua na penumbra, de soslaio. O que o mantém são seus gols, espíritas. Acredito que seja abençoado por alguma entidade divina, seriam os deuses do futebol?
Esta sempre no lugar certo e no átimo certo.

Exemplo: Alecsandro…

Obs – 1: Alguns centroavantes podem ter ser um conjunto de qualidade e denominações.

Obs – 2: Ressalto que, alusão à cultura de abolir o nove de oficio é tratado platonicamente. Há centroavantes caneludos na Europa.