O Barrense


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Pescaria

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Chove torrencialmente na pacata Barra do Ribeiro. No quintal da família Rocha acumulam-se poças. O patriarca da família decide pregar uma peça em seu neto:

– Diego, vamos pescar?
– Com essa chuva, vô?
– Claro! A chuva é quem traz o peixe.
– A chuva?
– Sim, cada gota de chuva carrega um lambari.
– Então choveu peixe?
– De certa maneira, sim.
– E em todas as poças aqui do quintal tem peixe?
– Isso mesmo.
– E eu posso pescar eles?
– Na garagem tem uma vara e anzol que tu pode usar. Não precisa nem de minhoca.

O pequeno Diego disparou em direção da garagem. Encontrou a vara, o anzol e um banco. Escolheu minuciosamente a poça, optou pela mais larga, pensará que ali haveria mais peixes. Sentou-se de fronte pra poça. Lançou o anzol na água e esperou. Esperou uma tarde inteira. Não compreendia como visualizava o fundo da poça e não enxergava os peixes, afinal de contas, a água era rasa e cristalina, mas acreditava em seu avô. Tratava-se dum pescador experiente, sabido das manhas e das manhãs.

– Daço, o que o Diego faz sentado na frente daquela poça? – pergunta a esposa do matuto pescador.
– Pescando.
– Pescando? Mas pescando o que?
– Lambari.
– Lambari numa poça, Daço?
[não contém a risada]
– Tu aprontou com o menino? Não tem pena? Olho o tanto de tempo que o coitadinho tá ali.

O menino seguia engajado em sua “pescaria”. Até resolvera migrar de poça pra testar a sorte em outras. Utilizava de técnicas avançadas de pescaria, claro, ensinadas por seu avô. Da dança do anzol ao elevador de linha, macetes que em outras pescarias eram garantia de sucesso se demonstraram fracassos retumbantes.

– E então, Diego?
– Nada, vô.
– Que estranho, já perdi as contas de quantos lambari peguei nessas poças.
– Acho que não é meu dia de sorte.
– Pode ser, quem sabe tu vem pra dentro e deixa pra outro dia?
– E quando é que vai chover de novo?
– Porque?
– Quero ver em qual poça os peixes vão cair pra ter certeza de onde pescar.

Diego esperou a próxima chuva. Demorou mais do que imaginava, mas chegou. Antes das gotas se precipitarem ele já estava posto na janela, observando as nuvens. As gotas caíam de maneira vertiginosa, Diego franzia o senho para acompanha-las. Num dado momento, arregalou os olhos e jurou ter visto um corpo estranho na gota.
Observou onde ela caiu e disparou pra garagem. A vara já estava pronta. Passou a mão no banco e sentou-se de fronte a poça.

“Hoje será diferente”, pensou.