– Dindo, me leva na pracinha?
(Finge que não está ouvindo)
– Dindo!
– Que foi, Laura? – pergunta, sem tirar os olhos da TV que está passando um monótono Arsenal x Chelsea.
– Me leva na pracinha?
– E o que tu vai fazer na praça, Laura?
– Ver o Papai Noel e andar de balanço.
– Hum…
– …
– …
(Me puxando) – Dindo, vamo.
Cedi ao apelo de minha sobrinha.
– Olha quanto brinquedo!
– É da casa do Cadu.
– Que legal os brinquedos do Cadu.
– Muito legal. Então, Laura. O que tu quer do Papai Noel?
– Os mesmos brinquedos do Cadu.
– Mas tu é menina, Laura. Não quer uma Barbie?
– Não! Quero os brinquedos do Cadu.
– Mas é brinquedo de menino!
– Não posso ter brinquedos de menino?
– É, acho que não.
– Quem disse?
– Bom…
– Quero os brinquedos do Cadu! Nada de Barbie.
(começa a chover)
– Que pena, Laura. Está chovendo. O passeio no parque fica para a próxima.
Retorno a poltrona e ao jogo, quando…
– Dindo, parou de chover! Vamos ao parque.
– Tá.
– Vem, vamos.
Fomos…
– Nos vamos ver o Papai Noel, Dindo?
– Vamos sim, Laura.
– E andar de balanço?
– Tu não tens medo?
– Não! Eu não tenho medo. E tu não precisa ficar com medo, Dindo. Eu te ensino a andar de balanço.
– Ah, se tu me ensina então está bom.
(Nos deparamos com uma esquina)
– Parô, Parô, Parô.
– Que foi, Dindo?
– O que precisamos fazer numa esquina?
– Atravessar?
– Não. Tenta de novo.
– Comer galinha.
– Comer galinha na esquina, Laura?
– É. Na esquina da minha casinha sempre tem galinha preta.
– Hum… Mas essa galinha de esquina não se come, nem pode tocar nela.
– Porque não?
– É coisa do Bicho papão. Se tocar cai o dedo.
– Meu dedinho? Não quero perder meu dedinho.
– Tu não vai perder, Laura.
– Ta…
– Mas então, o que se faz em uma esquina?
– Não sei.
– Olhamos para os dois lados pra ver se não vem carro.
– Carro é perigoso, né?!
– Bem perigoso, por isso só atravessamos olhando pros dois lados.
– Dindo, já olhei pros dois lados e não vem carro. Podemos atravessar e ir ver o Papai Noel?
– Claro, vamos…
Entramos no parque municipal onde se encontra a bendita praça e o Papai Noel que a enfeita.
– Olha, Laura, um Papai Noel gremista – disse, apontando prum Papai Noel tricolor.
– E um colorado – disse a pequenina, me rebatendo e aprontando pro Papai Noel rubro negro.
– É, mas tu precisa aprender em uma coisa…
– Papai Noel, Papai Noel – disse ela, disparando em direção ao Papai Noel e me ignorando por completo.
Após nos aproximarmos dos Papais Noeis…
– Laura, tu é gremista ou colorada?
– Eu não sei.
– Então. Acho que tu és gremista.
– Por quê?
– Ora por que. Simplesmente é. Teu pai é, teu vô é, eu, teu Dindo, sô gremista. Quer mais o que?
– Mas minha mamãezinha é colorada.
– Entendo. Mas existem coisas que tu precisa saber.
– O que?
– Existem apenas três verdades na vida.
– Só três?
– Sim. Primeiro: Quando seus pais tentarem te ensinar, procure aprender, porque a vida não ensina com o mesmo amor! Segundo: Não minta. É feio. Coisa do bicho papão. E, por ultimo, mas não menos importante: tu és gremista.
– Por quê?
– Por quê? Porque o time do Inter é o time do bicho papão.
– Do bicho papão?
– É!, Um time ruim. Time dos bichos. Eles são malvados.
– Eu não gosto do bicho papão.
– Isso. Não pode gostar.
– E o Grêmio, Dindo?
– É o time dos bonzinhos. Time de herói que combate o bicho papão. Que não deixa ele te pegar de noite. Que expulsa ele do teu armário. Que não deixa ele ficar de baixo da tua cama.
– Então o Grêmio é meu herói.
– Isso mesmo. Time de super-heróis.
Enfim fomos andar de balanço.
– Dindo?!
– Que foi, Laura?
– Eu quero ser do Grêmio. Do time bom.
– Isso mesmo, minha afilhada. Bela escolha. Bela escolha.
Ufa! Está bem encaminhada.